As assaduras, quando não tratadas, tendem a se estender gerando dor, desconforto, prurido, alopécia, mal odor e sofrimento. Por ser lesão pruriginosa a localização facial requer cuidados imediatos, pois pode expor os olhos do cão. O ato de coçar pode levar a úlceras de córnea, ou mesmo precipitar o prolápso da glândula da terceira pálpebra. (4)
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Bulldog Inglês resgatado de um CCZ. Extremamante magro e sofrendo com suas rugas. As imagens chocantes retratam a realidade dos cães negligenciados. |
Nas dobras cutâneas ocorre fricção de pele sobre pele, retenção de umidade, falta de ventilação, calor e acúmulo de epitélio descamado que facilitam o surgimento do intertrigo ou assadura. É causado por fungos (normalmente do gênero
Malassezia spp), leveduras (em geral Candida sp, um comensal que habita a pele do homem e cão) ou bactérias que ali encontram ambiente favorável ao seu crescimento.
A lesão inicial é um eritema leve que pode progredir para uma resposta inflamatória mais intensa com erosões, edema, exsudação, maceração e formação de crostas. A coloração pode ser vermelha ou castanho-avermelhada. Geralmente acomete as pregas faciais, região vulvar, laterais da bolsa testicular e prega sacral (inserção da cauda). Pode também acometer axilas e ventre. Comumente desencadeia alopécia na área intertriginosa afetada.
Condições anatômicas predispõem ao intertrigo:
- A carinha achatada das raças braquicefálicas como Bulldog Francês e Inglês, Pug, Pequinês, Mastim Napolitano dentre outros. Nem os gatos escapam, os Persas em especial.
- As pregas labiais profundas do Cocker e Springer Spaniel, Setter, Newfoundland, Clumber Spaniel e São Bernardo predispõem ao pioderma da dobra labial.
- As pregas do Shar Pei, Bloodhound e as pregas dos membros do Basset Hound também podem ser acometidas.
- Cauda encravada como Bulldog Francês, Inglês e Boston Terrier.
- Incontinência urinária que pode surgir em cães muito idosos. Já ouviu falar de vózinhas que precisam usar fraldas? Pois com nossos cães a coisa não é muito diferente.
- Vulva juvenil ou retraída.
Tenho ou não tenho intertrigo?
A lesão é muito característica, mas a melhor maneira de saber com certeza é perguntar ao seu vet. Ele poderá dizer se o cão tem intertrigo apenas olhando a lesão. Não é preciso nenhum teste especial.
Lesões refratárias ao tratamento, sem que haja explicação para a recorrência, devem ser investigadas quanto a possíveis alterações endócrinas (especialmente disfunção tireoideana), desnutrição (doenças disabsortivas de relativa prevalência em frenchies) ou neoplasias.
Como tratar?
Para casos mais leves o vet vai lhe dizer para manter a área afetada da pele, limpa e seca. O uso de shampoos à base de
clorexidine* ou peróxido de benzoíla** podem ser uma boa opção para lavar a área atingida(2) (3). Ele também poderá prescrever medicação tópica. Para casos mais graves pode ser necessário o uso de creme antibiótico ou antifúngico. A principal complicação que pode estar associada ao intertrigo é o pioderma, nesse caso pode ser necessário o uso sistêmico de antibióticos ou antifungicos. O vet irá decidir pela melhor forma de tratamento.
Preferencialmente deve-se evitar o uso glicocorticóides tópicos, especialmente os de alta potência, no tratamento do intertrigo. Essas drogas podem interferir na síntese epitelial e do colágeno. Glicocortióides de baixa potência podem ser utilizados em associação a antifungicos, no entanto é desnecessário. A função geralmente é reduzir o prurido, dor e calor local, no entanto a terapia antifúngica por si só é capaz de eliminar rapidamente esses sintomas.
A apresentação(veículo) das formulações contendo antifungicos/glicocorticóides importa. Um exemplo seria o propionato de betametasona, que representa um glicocortióide de classe II quando o veículo é creme, mas que se transforma em classe III quando o veículo é loção. Então fique de olho pois pode haver combinações inadequadas de drogas em associação.(9)
* O clorexidine pode ser instável, então é aconselhável selecionar formulações bem preparadas para se obter o melhor resultado contra Mallasezia e bactérias.(5)
**O peroxido de benzoíla deve ser utilizado com cautela pois animais com sensibilidade ao produto podem desenvolver irritações cutâneas.(5)
Como posso evitar o problema?
Limpe as dobrinhas de seu cão e mantenha uma rotina de verificação diária das “áreas de risco”. A frequência da limpeza pode variar de duas vezes por semana até diariamente, dependendo do cão.
Seque completamente o animal depois do banho. Use o secador na temperatura fria para garantir a completa evaporação da água sem causar desconforto ou
hipertermia.
Manter a higiene, controlar o peso do animal evitando a obesidade e seguir uma dieta nutritiva também pode ajudar a evitar assaduras (2)(6)(7).
Dobras e rugas de causar inveja
Pregas faciais
Passe delicadamente nos sulcos da face uma fraldinha ou algodão macio embebido em água e seque bem. Alguns preferem lavar as rugas com o mesmo shampoo usado no banho do cão enxaguando e secando muito bem. Em seguida aplique pequena quantidade de pomada para assaduras de bebê. Há várias opções no mercado desde cremes leves que não deixam vestigios ou odor como a Drapolene* (só previne, não trata) e Bepantol (previne e trata) passando pela adstringente Pasta D'Água até os cremes de barreira como Hipoglós ou Desitin (importado).
Ao lavar com shampoo ou usar creme entre as rugas muito cuidado com os olhos de seu cãozinho. Suspenda o uso de qualquer produto ao menor sinal de sensibilidade.
Seguindo uma rotina de cuidados seu frenchie apresentará a pelagem da face intacta e livre de assaduras.
Região perivulvar
Vulva juvenil ou retraída pode estar presente em animais de qualquer raça e não apresenta correlação com a ovariohistectomia, castração(1). Fêmeas que apresentem vulva com essa conformação necessitarão de um pouco mais de cuidado para evitar assaduras ou o doloroso pioderma perivulvar. A ocorrência de intertrigo ou pioderma normalmente tem inicio por volta de um ano de idade.
As meninas deverão ter sua região genital examinada com freqüência e se necessário fazer uso de cremes contra assaduras. Cremes de barreira à base de óxido de zinco podem ser uma boa opção. Nas raças de pelagem longa a manutenção da tosa higiênica ajudará a conservar a área mais seca, limpa e fácil de ser examinada.
Inserção da cauda
A cauda "encravada" pode facilitar o desenvolvimento de intertrigos e dermatites. Geralmente só lavar a área com shampoos à base de clorexidine ou peróxido de benzoíla e secar muito bem já ajuda a tratar.
As comissuras labiais
Intertrigos e dermatites nessa área podem ser difíceis de tratar somente com medicação tópica. Lavar com água morna e secar com frequencia a região afetada geralmente resolve o problema. A maioria das pomadas, unguentos e shampoos tem odor e sabor intoleráveis e podem aumentar o desconforto do animal. Pode ser necessário o uso de antibióticos orais se evoluírem para o pioderma.
Dica
Os shampoos medicamentosos utilizados para tratar o intertrigo e pioderma podem ser diluídos na proporção 1:2 ou 1:4. Isso facilita a formação de espuma, dispersão do produto bem como o enxague.(8)
Agradecimentos à
Patrícia Machado, Sueli Camargo e Viviane Dubal que participaram do resgate e total recuperação do querido Tigrão e nos cederam as fotos para essa postagem.
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O mesmo cão das fotos acima totalmente recuperado. |
Com o cuidado e amor que recebeu de suas protetoras vejam quem já está sorrindo novamente.
Sirley Vieira Velho
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Referências
1-Scott P. Hammel, BA and Dale E. Bjorling (2002): Results of Vulvoplasty for Treatment of Recessed Vulva in Dogs. In: Journal of the American Animal Hospital Association 38:79-83 (2002.
2-William R. Fenner- Consulta Rápida Em Clínica Veterinária. 3ª Edicção. Ed Guanabara Koogan -RJ 2003.
3-Linda Medleau, Keith A. Hnilica-
Small Animal Dermatology Atlas and Therapeutic Guide-Ed Saunders Elsevier- SEcond Edition -2006.
4- Muller &¨Kirks -
Small Animal Dermatology 6th Edition-Elservier. Philadelfia USA,2001.
5- David H. Lloyd-
Optimising Topical Therapy in the Threatment of Skind Disease, 35th World Small Animal Veterinary Congress 2010- IVIS.
6-
P. Prélaud and
R. Harvey- Encyclopedia of Canine Clinical Nutrition ,Nutritional Dermatoses and the Contribution of Dietetics in Dermatology, International Veterinary Information Service, Ithaca NY (www.ivis.org), Last updated: 18-Dec-2007; A4202.1207
7-P. Roudebush- Hill’s Pet Nutrition, Inc., Topeka, KS, USA 2007.
8- Merck & Co., Inc -The Merck Veterinary Manual,Whitehouse Station NJ, USA-2008.
9-Eva R Parker-Candidal intertrigo, Official topic from UpToDate, Last literature review version 18.3: Setembro 2010 | This topic last updated: Setembro 2, 2010.