Cirurgia para megaesôfago ou acalasia em cães.



O objetivo desse post é tornar público o caso de uma Bulldog Francesa de 19 meses submetida, com sucesso, a uma técnica modificada da cardiomiotomia de Heller. Trata-se do reparo cirúrgico do cardia (esfíncter esofagiano inferior) como tratamento do  megaesôfago ou acalasia.
Neste caso específico a eutanásia já havia sido indicada.


Bibi reduzida a pele e ossos três dias após a cirurgia. Aqui ela tinha pouco mais de seis quilos e já havia ganhado peso.


A boa notícia vem para aqueles que possuem um cão acometido  pela enfermidade. 


 
A recomendação veterinária para casos graves da doença, até então, era a eutanásia, porém a medicina humana há décadas trata pessoas acometidas por essa condição. Antes que a miotomia fosse praticada em humanos muitos cães foram submetidos a ela com êxito, pobres cobaias.  No entanto livros de medicina veterinária não relatam o fato. Ao contrário disso e estranhamente alguns autores citam até mesmo a ineficácia da técnica quando aplicada em cães (1, 2, 3, 4).  

O megaesôfago é uma doença de causa ainda desconhecida podendo estar associada a outras doenças. Há perda da motilidade ou peristaltismo esofagiano e falência no relaxamento da musculatura do esfíncter ou válvula na transição do esôfago com o estômago (o cardia). Tal condição não permite o trânsito adequado dos alimentos. Eles ficam estagnados no esôfago promovendo sua dilatação progressiva e por consequencia episódios recorrentes de regurgitação, disfagia, emagrecimento e pneumonias aspirativas. Quando não tratado pode levar à inanição, caquexia, desidratação e morte. 

Como opção não cirúrgica há a possibilidade de realizar injeção de botóx (toxina botulínica) por via endoscópica na área da transição esôfago-gástrica (cárdia). Esse tratamento é paliativo pois os efeitos da toxina botulínica são degradados e o relaxamento do cárdia deixa de ocorrer em alguns meses. A cirurgia videolaparoscópica, por se tratar de método menos agressivo é praticada em humanos e poderia muito bem ser desenvolvida em cães resultando em recuperação mais precoce.

Foto cedida por Josiane Pires

A cirurgia não é curativa, pois não recupera o peristaltismo esofágico, mas sim irá permitir a continuidade do fluxo dos alimentos. Faz-se necessária a permanência na posição vertical até que o alimento chegue ao estômago. A ação da gravidade passa a ser  fundamental para o trânsito do bolo alimentar. O fato do ortostatismo dos quadrúpedes ser diferente do humano pode ter sido a causa da frustração daqueles autores. A cirurgia garante a chegada do alimento ao estômago mas não dispensa os cuidados posturais e dietéticos.


 Nutición Clínica en Pequeños Animales - 4ª Edición. Hills

Dois amigos cirurgiões, um médico e o outro veterinário, uniram-se em fevereiro de 2010 e realizaram a miotomia, reparo cirúrgico para tratamento do megaesôfago (acalasia) em um cão com sucesso. A paciente foi uma jovem fêmea de Bulldog Francês e a técnica utilizada foi a mesma que hoje é praticada em humanos. Foi realizada uma cirurgia para abertura do esfíncter esofagiano inferior além da confecção de uma válvula para coibir o refluxo. 

Hoje a cachorrinha leva uma vida saudável e feliz. 

Em fevereiro de 2011 completou um ano da realização da cirurgia. A frenchie ficou restrita a refeições pastosas e precisa adotar elevação do tronco enquanto come. Quem a vê jamais a imaginaria em estado caquético e condenada à eutanásia. Sua família humana agradece cada dia vivido ao lado dessa pequena vencedora e sortuda. Ela encontrou profissionais que somaram esforços para lhe oferecer vida quando todos recomendavam a morte como única forma de aliviar o sofrimento.
A criatividade está em buscar a melhor saída. Praticamente tudo já foi dito, feito ou pensado. Cabe ao homem tomar do conhecimento e fazer bom uso.” (Sirley Vieira Velho)

Conheça a luta e vitória de Bibi e sua família

Por Lisandra Krummenauer Moura,  proprietária do Canil Masllov

Bibi era uma cachorra saudável e feliz. Foi cruzada em seu segundo cio. A partir daí começou seu sofrimento. Regurgitava frequentemente: algo típico da prenhez. No começo o sintoma não causou maiores preocupações, pois não é incomum frenchies regurgitarem. O calor intenso de dezembro de 2009, associado à gravidez justificaria o fato. Em 30 de dezembro de 2009 ela deu à luz dois filhotes, sendo que um deles morreu ao nascer. 

Cerca de 20 dias depois do parto o número de regurgitações diárias passou a se tornar progressivamente maior. Nesse momento percebemos que algo estava errado. Ela foi levada ao plantão veterinário onde colheram amostras de sangue e foi submetida a um RX. Depois disso foi dispensada com suspeita de virose. 

Recomendaram uma dieta a base de frango e arroz e o retorno no dia seguinte para avaliação dos resultados dos exames. Nesse meio tempo até o dia seguinte mergulhamos na internet em busca de respostas. Dentre todos os artigos pesquisados a possibilidade era de que se tratasse de acalasia ou megaesôfago. No retorno ao vet. os exames se mostraram normais, inclusive o RX. Porém já havíamos nos antecipado e sabíamos que na maioria dos casos de acalasia apenas o RX contrastado pode dar o diagnóstico. Isso foi sugerido ao vet. que muito a contragosto atendeu a nossa insistência e repetiu o exame, dessa vez com contraste. 

                               RX mostrando dilatação e estagnação do contraste no esôfago 
                                             selando o diagnóstico de megaesôfago 



Alguns cães sobrevivem bem comendo na posição vertical. O alimento desce até o estômago e não volta mais. Outros infelizmente acabam sacrificados ou morrem de inanição, pois o alimento não chega ao estômago. Não existe tratamento que seja capaz de restabelecer o tônus e a motilidade esofágica. Uma vez dilatado ele perde os movimentos peristálticos que empurram o alimento para dentro do estômago. Com a Bibi a situação foi grave, o esfíncter que existe entre o esôfago e o estômago estava hipertônico, por isso o esôfago dilatou. Seguimos a orientação de alimentação pastosa, mas em sete dias só havia aceitação de líquidos.

Iniciamos uma busca desesperada por algum tratamento. As repostas eram desanimadoras e unânimes: “não havia solução, a cirurgia traria pouco ou nenhum resultado e não era recomendada”. Aconselhavam sacrificá-la, justo ela que dormia com minha filha. Onde buscar coragem para isso?  
Cadeira para alimentação de animais com  megaesôfago
Nesse tempo eu trocava idéias com a Sirley e o Evandro, amigos do canil Skonbull. Eles sugeriam que eu a levasse até Florianópolis e lá viabilizariam, juntamente com o veterinário do canil, uma cirurgia há muito realizada em humanos. Evandro é médico cirurgião e estava familiarizado com tal procedimento. Eu tinha medo de tentar e não dar certo. Queria saber de alguém que já tivesse feito esse procedimento com resultado positivo em cães. 

Finalmente chegou ao limite, nem líquidos passavam mais. Ela regurgitava até mesmo a água. Estava definhando dia a dia. 

A levamos a um veterinário que perfurou sua bochecha e através desse orifício introduziu uma sonda até seu estômago. Assim passamos a alimentá-la com leite injetado por seringa através da dita sonda. O desconforto era imenso e foram quatro dias até que ela mastigasse triturasse e regurgitasse a sonda. Tirei os pedaços da sonda pelo furo na face. Fiz um curativo e finalmente tomamos a decisão "chega de machucar a pobrezinha". Liguei para a Sirley e combinei de levá-la no carnaval, quando teríamos folga. Precisávamos arriscar, afinal a eutanásia não é algo facilmente tolerável. Por dias injetamos soro através de um acesso venoso em sua perna. As veias estouravam com facilidade. Para mantê-la viva até a cirurgia, na ausência de veias, comecei a administrar soro por via subcutânea. Fazia bolas enormes de líquido sob sua pele. É horrível ter de furar o bichinho da gente várias vezes ao dia num procedimento doloroso. Ela morria de medo de mim.  

No carnaval eu e minha filha a levamos até Florianópolis. A Sirley e o Evandro se assustaram com a magreza da Bibi. Ficaram temerosos quanto a ela resistir ao procedimento cirúrgico. Ela foi levada até a clínica veterinária onde foi operada. Foi cortado o esfíncter que fechou e criada uma válvula anti-refluxo com o fundo do estômago para a comida não voltar mais. Além da cirurgia do esôfago foi realizada também sua castração.

Voltamos para casa e aos poucos ela foi se recuperando. 





Hoje está faceira e totalmente saudável. Observamos que a alimentação pastosa causa menos desconforto. Ficamos com ela no colo em posição elevada até que arrote, semelhante ao que fazemos com bebes humanos. Minha filha é quem dá a comida a ela. De minha mão ela se recusa a comer pois associou com "passar mal". Até hoje ela treme quando vê a lata de comida, tem medo de comer, se esconde embaixo dos móveis. Tirando esse medo ela é uma cachorrinha super feliz, passeia conosco, brinca com os outros cães e ainda dorme com minha filha. Não ficaram sequelas físicas.

O comprometimento dos donos no manejo do cão é essencial para o sucesso da cirurgia e tratamento (5).

 Sirley Vieira Velho

Seja gentil, seja coerente e correto cite a fonte original sempre.


Referências

1- William R. Fenner-Consulta Rápida Em Clínica Veterinária. 3ª Edição, Ed Guanabara Koogan - RJ 2003.
2- Richard W. Nelson, C. Guilhermo Couto-Medicina Interna de Pequenos Animais - 4 Edição. Editora Elsevier Ltda. 2010.
3-Hoskins, Johnny D-Veterinary Pediatrics Dogs and Cats from birth to six months-3rd edition-Ed Sounders Philadelphia, PA, USA – 2001 
4- Todd Tams-Handbook of Small Animal Gastroenterology - Ed. Saunders. West Los Angeles, CA 2003. 
5- The Merck Veterinary Manual, Merck & Co., Inc -Whitehouse Station NJ, USA-2008. 
6- Stuart J Spenchler-Clinical Manifestation and Diagnoses of achalasia -Last literature review version 18.3: September 2010-www.uptodate.com 
7- Stuart J Spechler-Overviw of the treatment of achalasia - Last literature review version 18.3: September 2010-www.uptodate.com 
8- Stuart J Spechler-Pathophysiology and etiology of achalasia-Last literature review version 18.3: September 2010-www.uptodate.com
9- Thatcher Remillard et all-Nutritión en Pequeños Animales- Hand, 4ª Edición- Ed Hills 2000.

Dica de leitura : Superinteressante março 2011

" Eles se apaixonam, fazem planos para o futuro,sentem saudade, tecem intrigas  e enganam você. A ciência começa a descobrir que sim, os animais também são gente. Para o bem e para o mal."
Texto de Eduardo Szklarz e Alexandre Versignassi

Quem gosta e respeita os animais já sabia de tudo isso e mais um pouco... Quem já leu alguns texto por aqui e conhece a linha do blog sabe da constante correlação que fazemos entre saúde e comportamento humano e animal, então poderá curtir essa matéria.
O texto vale para você que já está careca de saber e quer confirmar que não é o único a pensar assim e vale principalmente para aqueles que se julgam "animais superiores".

Fica aqui nossa dica de leitura :))

Sirley Vieira Velho

E por falar em criação...



Antes de cogitar uma ninhada considere os perigos inerentes ao fato. Até o mais zeloso criador estará sujeito a eles.

Lembre-se do crescente número de animais abandonados, inclusive cães de raça pura.
Encaminhar um filhote pode ser o momento mais difícil do criador não comercial.

Duras verdades da criação (Adptado do texto original de Jane Anderson)

- Ao cruzar um animal você o submeterá a riscos, até mesmo risco de vida.

- Um cruzamento é uma despesa e você provavelmente terá muito mais gastos do que retorno pela venda dos filhotes.

- Independentemente do quão experiente você seja, ninguém estará imune a desastres.

- Prepare-se para as repousantes noites em claro.

- A morte de um filhote, mesmo em uma ninhada grande, é sempre dolorosa. Prepare-se para enfrentar isso.

- É difícil salvar um filhotinho da síndrome do desvanecimento. Se eles ficarem hipotérmicos eles morrem. Se ficarem hipoglicêmicos eles morrem. Se ficarem desidratados eles morrem. Você poderá perder uma ninhada inteira por essas causas se não souber como evita-las, reconhece-las ou se não for capaz de socorrer um filhote nessas circunstâncias.

-É impossível predizer o sucesso de um cruzamento, por melhor que seja o par. Independentemente de serem típicos ou não, saudáveis ou doentes cada um dos filhotes é sua responsabilidade. Cada um deles necessitará de cuidados veterinários e de higiene, boa alimentação, atenção, carinho, socialização e de um bom lar.

- O veterinário perfeito não existe. Você possivelmente terá de liderar a maior parte das decisões diante de uma cruza. Isso poderá incluir:
  •  Todo o preparo da matriz que inicia-se bem antes do cio:
  •  A forma como a fêmea irá conceber;
  •  A condução de uma prenhez normal ou complicada;
  • atenção à matriz quanto ao parto ( lembre-se de que você não poderá contar com o veterinário "perfeito" acampado em sua sala o tempo todo) ;
  •  Aleitamento até os cuidados com recém nascidos saudáveis ou "doentes" etc.

Com um mundo de informações ao alcance de todos não se admite que animais padeçam por circuntâncias evitáveis apenas porque o "criador" as desconhecia. 

Uma cruza não é simplesmente juntar dois animais . Esse tipo de prática não se aplica a cães de raça por ser perigoso e imprudente, então muna-se de conhecimento antes de se aventurar:





-leia muito;
-forme uma biblioteca;
-tenha um criador que te oriente;
-mas lembre-se de que nunca saberemos o suficiente!


Quando julgar que já aprendeu um pouco divida com outros. Ensinar é aprender duas vezes.




Animais destinados à reprodução deveriam ser selecionados de forma racional.
 Estudar um pedigree vai além de saber reconhecer os títulos de beleza ali documentados.
O amor que você sente por seu cãozinho não é razão suficiente para justificar uma cruza. 
Animais destinados à companhia (pet) não se prestam à reprodução. Considere a possibilidade de castrar seu animal de estimação.



-Você terá sido responsável se tudo correr bem ou se algo der errado.







Sirley Vieira Velho

Direito reservados
Seja gentil, seja coerente e correto cite a fonte original sempre.


Referências:

1- Jane Anderson- Aprenda a criar http://www.learntobreed.com/
2- Phyllips A. Holst- Canine Reproduction, The Breeder's Guide, 2nd Edition, 2000- Alpine Blue Ribbon Books-USA
3-Chriss Walkowicz and Bonnie Wilcox- Successful Dog Breeding, the complete handbook of canine midwifery, 2nd Edition, Howell Book House-USA


Criação e bem estar animal: juntos sim, por que não?

 Traduzi a introdução deste artigo. Clique no link para baixar na íntegra o conteúdo completo e original na língua inglesa e francesa. Vale a pena conferir tim-tim por tim-tim.

Sirley Vieira Velho




Can Vet J. 2007 September; 48(9): 953–965.


Hoje estão catalogadas mais de 500 doenças de transmissão genética em cães de raça pura(1). Doenças hereditárias como a displasia coxofemural, síndrome braquicefálica, miocardiopatias, disfunções endócrinas, desordens sanguíneas (nota do tradutor: discrasias sanguíneas e coagulopatias) e centenas de outras que podem afetar a qualidade de vida e a longevidade dos cães. As mais de 400 raças atualmente existentes, são construções artificiais da fantasia humana, em vez de o resultado evolutivo da seleção natural (2,3). A ampla gama de doenças genéticas encontradas em cães de raça pura reflete o seu desenvolvimento não natural. As associações cinófilas e os criadores são em grande parte responsáveis pelo bem estar animal(2,4-6). 

Veterinários também têm facilitado a progressão desta situação. Como profissionais conhecedores da saúde e cuidado animal , deveriam participar das resoluções que dizem respeito a saúde. Felizmente  proprietários de cães, criadores responsáveis, veterinários e cientistas do bem-estar animal podem exercer pressão suficiente para convencer o Canadian Kennel Club (CKC) e outras associações de criadores a reavaliar e redefinir seus regulamentos e padrão das raças para acabar com a endogamia que causa tantos problemas genéticos (7-9). Vários aspectos ligados a doenças genéticas relacionadas a raças caninas devem ser investigados para que se possa determinar que mudanças precisam ser feitas nas atuais praticas de criação e como essas mudanças seriam efetivamente implementadas, 
O papel histórico das raças criadas pelo homem, padrões modernos de clubes de raças, métodos de melhoramento e genética canina devem ser explorados para que se possa entender as principais causas dos problema bem como a forma de serem resolvidos. Responsabilidade ética pertinente a veterinários e criadores devem ser consideradas.



Seja gentil, seja coerente e correto: cite a fonte original sempre.

Só pra cachorros!


Quando a criatividade torna o dia-a-dia mais fácil e gostoso...


A dona dessa cachorrinha ia reformar seu banheiro. Na mesma ocasião aproveitou pra criar um banheiro canino composto de :
  • Paredes e chão com revestimento cerâmico;
  • Um ralo e sobre ele o tapete higiênico;
  • Uma duchinha higiênica  para facilitar a limpeza.

É ou não é uma idéia maravilhosa?



O projeto é da Regina que declara:

"Depois de "sofrer"algum tempo para adestrar a minha Fiona a fazer xixi no lugar certo, ao reformar o meu apê, resolvi projetar um banheiro pra ela, com direito a ralo e duchinha higiênica. Não é que funcionou? Ela está tão educada, que até pra vomitar usa o "banheiro" dela."


Sirley Vieira Velho

Direitos reservados
Seja gentil, seja coerente e correto cite a fonte original sempre.

Amar vale a pena

O que o video tem haver com frenchies ou criação de cães?
Talvez faça todo o sentido para alguns...

Para emocionar, tocar ou ao menos  fazer pensar.

Babar e comparar é só começar...

Westminster Kennel Club 2011, licores, sabores, cores e muito mais...

Frenchies e mais Frenchies vejam quem etava lá


Sirley Vieira Velho

Intertrigo ou assadura, isso não tem graça não!

As assaduras, quando não tratadas, tendem a se estender gerando dor, desconforto, prurido, alopécia, mal odor e sofrimento. Por ser lesão pruriginosa a localização facial requer cuidados imediatos, pois pode expor os olhos do cão. O ato de coçar pode levar a úlceras de córnea, ou mesmo precipitar o prolápso da glândula da terceira pálpebra. (4)


Bulldog Inglês resgatado de um CCZ. Extremamante magro e sofrendo com suas rugas. As imagens chocantes retratam a realidade dos cães negligenciados.
Nas dobras cutâneas ocorre fricção de pele sobre pele, retenção de umidade, falta de ventilação, calor e acúmulo de epitélio descamado que facilitam o surgimento do intertrigo ou assadura. É causado por fungos (normalmente do gênero Malassezia spp), leveduras (em geral Candida sp, um comensal que habita a pele do homem e cão) ou bactérias que ali encontram ambiente favorável ao seu crescimento.
A lesão inicial é um eritema leve que pode progredir para uma resposta inflamatória mais intensa com erosões, edema, exsudação, maceração e formação de crostas. A coloração pode ser vermelha ou castanho-avermelhada. Geralmente acomete as pregas faciais, região vulvar, laterais da bolsa testicular e prega sacral (inserção da cauda). Pode também acometer axilas e ventre. Comumente desencadeia alopécia na área intertriginosa afetada.

Condições anatômicas predispõem ao intertrigo:

  • A carinha achatada das raças braquicefálicas como Bulldog Francês e Inglês, Pug, Pequinês, Mastim Napolitano dentre outros. Nem os gatos escapam, os Persas em especial.
  • As pregas labiais profundas do Cocker e Springer Spaniel, Setter, Newfoundland, Clumber Spaniel e São Bernardo predispõem ao pioderma da dobra labial.
  • As pregas do Shar Pei, Bloodhound e as pregas dos membros do Basset Hound também podem ser acometidas.
  • Cauda encravada como Bulldog Francês, Inglês e Boston Terrier.
  • Animais obesos.
  • Incontinência urinária que pode surgir em cães muito idosos. Já ouviu falar de vózinhas que precisam usar fraldas? Pois com nossos cães a coisa não é muito diferente.
  • Vulva juvenil ou retraída.

Tenho ou não tenho intertrigo?

A lesão é muito característica, mas a melhor maneira de saber com certeza é perguntar ao seu vet. Ele poderá dizer se o cão tem intertrigo apenas olhando a lesão. Não é preciso nenhum teste especial.
Lesões refratárias ao tratamento, sem que haja explicação para a recorrência, devem ser investigadas quanto a possíveis alterações endócrinas (especialmente disfunção tireoideana), desnutrição (doenças disabsortivas de relativa prevalência em frenchies) ou neoplasias. 

Como tratar?

Para casos mais leves o vet vai lhe dizer para manter a área afetada da pele, limpa e seca. O uso de shampoos à base de clorexidine* ou peróxido de benzoíla** podem ser uma boa opção para lavar a área atingida(2) (3). Ele também poderá prescrever medicação tópica. Para casos mais graves pode ser necessário o uso de creme antibiótico ou antifúngico. A principal complicação que pode estar associada ao intertrigo é o pioderma, nesse caso pode ser necessário o uso sistêmico de antibióticos ou antifungicos. O vet irá decidir pela melhor forma de tratamento.

Preferencialmente deve-se evitar o uso glicocorticóides tópicos, especialmente os de alta potência, no tratamento do intertrigo. Essas drogas podem interferir na síntese epitelial e do colágeno. Glicocortióides de baixa potência podem ser utilizados em associação a antifungicos, no entanto é desnecessário. A função geralmente é reduzir o prurido, dor e calor local, no entanto a terapia antifúngica por si só é capaz de eliminar rapidamente esses sintomas.
A apresentação(veículo) das formulações contendo antifungicos/glicocorticóides importa. Um exemplo seria o propionato de betametasona, que representa um glicocortióide de classe II quando o veículo é creme, mas que se transforma em classe III quando o veículo é loção. Então fique de olho pois pode haver combinações inadequadas de drogas em associação.(9)



* O clorexidine pode ser instável, então é aconselhável selecionar formulações bem preparadas para se obter o melhor resultado contra Mallasezia e bactérias.(5)
**O peroxido de benzoíla deve ser utilizado com cautela pois animais com sensibilidade ao produto podem desenvolver irritações cutâneas.(5)


Como posso evitar o problema?

Limpe as dobrinhas de seu cão e mantenha uma rotina de verificação diária das “áreas de risco”. A frequência da limpeza pode variar de duas vezes por semana até diariamente, dependendo do cão.
Seque completamente o animal depois do banho. Use o secador na temperatura fria para garantir a completa evaporação da água sem causar desconforto ou hipertermia.
Manter a higiene, controlar o peso do animal evitando a obesidade e seguir uma dieta nutritiva também pode ajudar a evitar assaduras (2)(6)(7).


Dobras e rugas de causar inveja
Pregas faciais
Passe delicadamente nos sulcos da face uma fraldinha ou algodão macio embebido em água e seque bem. Alguns preferem lavar as rugas com o mesmo shampoo usado no banho do cão enxaguando e secando  muito bem. Em seguida aplique pequena quantidade de pomada para assaduras de bebê. Há várias opções no mercado desde cremes leves que não deixam vestigios ou odor como a Drapolene* (só previne, não trata) e Bepantol (previne e trata) passando pela adstringente Pasta D'Água até os cremes de barreira como Hipoglós ou Desitin (importado).

Ao lavar com shampoo ou usar creme entre as rugas muito cuidado com os olhos de seu cãozinho. Suspenda o uso de qualquer produto ao menor sinal de sensibilidade.

Seguindo uma rotina de cuidados seu frenchie apresentará a pelagem da face intacta e livre de assaduras.

Região perivulvar

Vulva juvenil ou retraída pode estar presente em animais de qualquer raça e não apresenta correlação com a ovariohistectomia, castração(1). Fêmeas que apresentem vulva com essa conformação necessitarão de um pouco mais de cuidado para evitar assaduras ou o doloroso pioderma perivulvar.  A ocorrência de intertrigo ou pioderma normalmente tem inicio por volta de um ano de idade.
As meninas deverão ter sua região genital examinada com freqüência e se necessário fazer uso de cremes contra assaduras. Cremes de barreira à base de óxido de zinco podem ser uma boa opção. Nas raças de pelagem longa a manutenção da tosa higiênica ajudará a conservar a área mais seca, limpa e fácil de ser examinada.


Inserção da cauda

A cauda "encravada" pode facilitar o desenvolvimento de intertrigos e dermatites. Geralmente só lavar a área com shampoos à base de clorexidine ou peróxido de benzoíla e secar muito bem já ajuda a tratar.

As comissuras labiais

Intertrigos e dermatites nessa área podem ser difíceis de tratar somente com medicação tópica. Lavar com água morna e secar com frequencia a região afetada geralmente resolve o problema. A maioria das pomadas, unguentos e shampoos tem odor e sabor intoleráveis e podem aumentar o desconforto do animal. Pode ser necessário o uso de antibióticos orais se evoluírem para o pioderma.

Dica

Os shampoos medicamentosos utilizados para tratar o intertrigo e pioderma podem ser diluídos na proporção 1:2 ou 1:4. Isso facilita a formação de espuma, dispersão do produto bem como o enxague.(8)


Agradecimentos à

Patrícia Machado, Sueli Camargo e Viviane Dubal que participaram do resgate e total recuperação do querido Tigrão e nos cederam as fotos para essa postagem.
O mesmo cão das fotos acima totalmente recuperado.


Com o cuidado e amor que recebeu de suas protetoras  vejam quem já está sorrindo novamente.



Sirley Vieira Velho

Direitos reservados
Seja gentil, seja coerente e correto, cite a fonte original sempre.



Referências
1-Scott P. Hammel, BA and Dale E. Bjorling (2002): Results of Vulvoplasty for Treatment of Recessed Vulva in Dogs. In: Journal of the American Animal Hospital Association 38:79-83 (2002.
2-William R. Fenner- Consulta Rápida Em Clínica Veterinária. 3ª Edicção. Ed Guanabara Koogan -RJ 2003.
3-Linda Medleau, Keith A. Hnilica-  Small Animal Dermatology Atlas and Therapeutic Guide-Ed Saunders Elsevier- SEcond Edition -2006.
4- Muller &¨Kirks - Small Animal Dermatology 6th Edition-Elservier. Philadelfia USA,2001.
5- David H. Lloyd-Optimising Topical Therapy in the Threatment of Skind Disease, 35th World Small Animal Veterinary Congress 2010- IVIS.
6-P. Prélaud and R. Harvey-  Encyclopedia of Canine Clinical Nutrition ,Nutritional Dermatoses and the Contribution of Dietetics in Dermatology, International Veterinary Information Service, Ithaca NY (www.ivis.org), Last updated: 18-Dec-2007; A4202.1207
7-P. Roudebush- Hill’s Pet Nutrition, Inc., Topeka, KS, USA 2007.
8- Merck & Co., Inc -The Merck Veterinary Manual,Whitehouse Station NJ, USA-2008.
9-Eva R Parker-Candidal intertrigo, Official topic from UpToDate, Last literature review version 18.3: Setembro 2010 | This topic last updated: Setembro 2, 2010.

Responsabilidade Legal e Medicina Veterinária

 Os animais de estimação representam verdadeiros membros da família para um número sempre crescente de pessoas. Não raro representam a única figura "familiar" de seus donos.
Diante do fato inegável da enorme afetividade que nos liga aos animais está também os cuidados dispensados com sua saúde. E quando nos deparamos com más práticas veterinárias que iatrogenizam ou mesmo culminam com a morte de um ente querido...

O erro médico e mais recentemente a regulamentação do exercício da medicina ou ato médico (PL:7.703/2006) sempre estiveram em evidência.

E quanto à medicina veterinária? 
  • Como é praticada a responsabilidade legal? O que é ato veterinário? 
  • Quantos já desejaram realizar um exame ou sugeriram uma prática médica para seu animalzinho e se viram impedidos de realiza-lo por ser "ato veterinário"? 
  • Como funciona a responsabilidade legal lá fora?

A publicação

Responsabilidad Legal y Medicina Veterinaria de Emergencia en Pequeños Animales en Estados Unidos Alison Marsh, DVM, JD



Como funciona  aqui no Brasil?

Sirley Vieira Velho

Acesso restrito ou mais outro blog?

Nos poucos anos em que nos dedicamos à criação de frenchies aprendemos com  erros e acertos nossos e de outros. Aprendemos também estudando, conversando e compartilhando com amigos.
Encerramos a criação no entanto o contato com a raça continuará. Se apaixonar pelo Bulldog Francês é um caminho sem volta...
Por essa e por tantas outras razões as abordagens dos posts em breve tomarão outro rumo e gostaríamos que  os novos conteúdos fossem abertos  somente para convidados.  Há limite de 100 pessoas estipulado pelo Blogger. Atualmente as visitações diárias ultrapassam bastante esse limite. Então há duas opções:

  • criarmos um novo Blog para acomodar as publicações que serão dirigidas a público restrito. Os inscritos deverão ter perfil público, vetado o anônimato.
  • concentrarmos todas as publicações em um só espaço restringindo todo o conteúdo que por enquanto é de acesso livre. Os inscritos deverão ter perfil público, vetado o anônimato.

Gostaríamos de sugestões e para isso criamos uma enquete no canto superior direito da página. Agradecemos a quem puder responder, bastam dois cliques.

Sirley

LinkWithin

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...